Friday 22 June 2007

A época das perplexidades



No século XX a internacionalização foi sustentada por atores empresariais que atuavam com agentes centrais da produção, mas também como atores políticos junto a sindicatos e partidos políticos.
Os motores da internacionalização foram as empresas domésticas que visavam o mercado nacional como campo de atuação e as empresas exportadoras que se lançavam ao mercado externo.
As empresas multinacionais que marcaram os anos 60 e 80 buscaram diversos tipos de vantagens comparativas: matéria-prima abundante ou exclusiva, salários baixos, proximidade de mercado consumidor e trabalharam com produtos de destaque individual.
Para enfrentar os novos desafios as empresas multinacionais reformularam as suas premissas organizacionais, redesenharam o mercado, buscando alongar a base social, ultrapassando os limites nacionais.
As empresas multinacionais dinamizaram três grandes processos de transformação: mundialização de estilos, usos e costumes, de globalização tecnológica, produtiva e comercial; e de planetarização da gestão.
Esses processos permitem vislumbrar movimentos diferentes e potencializadores: o nascimento de um tecnoeconomia global, rede de sociedades e comunidades ciber-espaciais e a configuração de um esboço político planetário que condicionam as rearticulações político estratégicos.

Mundialização de usos e costumes
A mundialização compreende a generalização e uniformização de produtos, instrumentos, informação e meios à disposição de importantes parcelas da população mundial.
A mundialização trabalha com a população mundial a despeito das suas diferenças históricas (culturais, sociais, nacionais religiosas) e das distâncias físicas – consome e reconhece como “seus” os mais diversos objetos e procedimentos.
Neste sentido, a mundialização lida com a massificação e homogeneização cultural, que se explicita nos hamburguers, pizzas, sorvetes. Mas a mundialização também incorpora as particularidades locais , regionais, nacionais. A mundialização é portanto é desdobramento da economia e da política. Refere-se a valores e referências, a produtos e métodos desejados e passíveis de utilização, nos mais diversos países sem ater-se à sua origem nacional ou cultural.
A mundialização tem como eixo de consituição – ao invés dos produtos mecânicos e dos instrumentos-objeto – os produtos “inteligentes” – os instrumentos sistema (computadores, telefones, tevês, fax , controladores) que fundem num só, os instrumentos-conhecimento e os serviços-sistema baseados na indústria da informação – aos quais são inerentes uma série de insumos e apoios múltiplos para a sua produção e manutenção.
A mundialização se realiza também por vias de macrossistemas infotelecom permitindo a difusão instantânea da informação (atuação transnacional da mídia visual e transmissão e disseminação cultural transfronteiras em tempo real), potencializada pelas diversas redes de serviços on-line, que inauguraram novas modalidades de compras, consultas, notícias, entretenimento, intercâmbio social e acadêmico.
A mundialização também se organiza e se faz a partir de megaespaços urbanos, diferenciados por sua localização física e sua história. Esses espaços-cidades concentram e agregam funções financeiras, industriais, científicas, tecnológicas, culturais e políticas – que se articulam e se inter-relacionam “por sistemas de formação que fornecem os quadros e os dirigentes das empresas e dos Estados”.

Globalização Tecnoprodutiva

A globalização é alavancada num novo tripé financeiro: o sistema bancário, que está assentado sobre muitos bilhões de dólares dos vinte maiores bancos do planeta, e da enormes quantias depositadas que chegam a mais de 6 trilhões de dólares; os fundos mútuos de ação; e as seguradoras.
A globalização traz consigo a concentração de capitais, reforçada por processos de associação e incorporação de diversos tipos (fusões de iguais, absorções hostis) e outras variadas razões: adição de valor às posições dos acionistas, redução de custos, ganhos de escala, tomada de posição em novos mercados, penetração regional ou nacional alcance multinacional, aumento da produtividade.
A globalização financeira, num mercado mundial inter-relacionado de capitais e serviços, escapa ao controle dos Estados e de seus bancos centrais, mesmo das instituições financeiras internacionais e multilaterais, graças aos recursos da teleinfocomputrônica e das novas tecnologias financeiras.
A globalização também se refere a uma multiplicidade de processos interativos (sinergias, coalizões, alianças, redes) preconizados por “produtores” e “gestores” transnacionais, que formulam diretrizes num universo sistêmico de decisões, refletindo uma interação seletiva e excludente das corporações estratégicas, centradas no espaço triádico.
Outro aspecto importante da globalização produtiva e de mercados se assenta na padronização de produtos, e por sua vez,é sustentada pela comunidade de consumo. A padronização é induzida pelos “fabricantes globais”. Ela traz consigo, num ritmo intenso, a globalização do varejo, principalmente através de empresas poderosas norte-americanas.
A globalização econômica exige a padronização de serviços e produtos , mas precisa lidar com a variedade de sociedades dos diferentes países. Nesse sentido, Estados e sociedades nacionais não podem ser padronizados por decretos, indução ou constrangimento. No entanto, a globalização coexiste, portanto, com realidades singulares e com processos de afirmação de particularidades que antecedem( ou se apresentam como reação ao fenômeno da mundialização).
A diversidade cultural também orientará o processo de globalização econômica, embora – num aparente paradoxo – passe a a introduzir novas formas de atividades, singularmente territorializadas: produção localizada baseada em recursos locais e até normas locais.
Segundo Dreifuss, a globalização e um termo que expressa a dualidade do fenômeno – o customizing (ajuste ao sabor local) e a harmonização (global) do produto e do produtor, dos procedimentos e das percepções – operando dentro de um mesmo processo de globalização.
Estimula-se a diversidade estrutural e recusa-se a padronização para combinar e fazer convergir as demandas específicas. Esta será a marca da primeira década do século XXI: o preparo do terreno para a nova mundialização de consumo e conjunção de singularidades , para a consolidação da globalização tecnoprodutiva e para a nova mentalidade planetária de gestão e percepção de si próprio na gaia da terra.
Planetarização político-estratégica
Os processos de mundialização e globalização se desdobram em diversas “horizontalizações” sistêmicas e espaciais: econômicas, políticas e societárias. Este conjunto de mutações em processo é coroado e sintetizado na noção de planetarização.
A planetarização trata de vínculos expressos na trama de organizações transnacionais e de instituições supranacionais que fazem parte de um novo tecido político e de gestão, e dá outro significado à noção de pertencer , resignificando a multiplicidade de inserções sociais e nacionais.
A planetarização envolve os perímetros intangíveis de infomação e a colossal influência cultural multicruzada – abrindo o capítulo das relações intersocietais. Nesse sentido, a planetarização lida com conflitos e contenciosos transnacionais e transfronteiriços.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

Dreifuss, René Armand. As transformações. In: A Época das perplexidades. Petrópolis: Vozes, 1996. p. 133-177.

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