O Conservadorismo político: conceitos e discussões
O termo “Conservadorismo” foi
criado pelo jornal de Chateaubriand na França em 1820, com a ideia de programar
a restauração política e clerical. Na Grã-Bretanha, apareceu pela primeira vez
no jornal Quarterly Review em 1830. Em meados da década de 1830 tornou-se a
designação oficial do partido Tori.
A
utilização do termo a partir de 1832 tentava sobretudo expurgar do partido as
antigas associações e trabalhar cuidadosamente um não rompimento com o passado,
mas uma certa alteração de rumo.
A
linha divisória que marca o pensamento conservador está centralizada sobre o
advento da Revolução Francesa. Um dos precursores do conservadorismo, Edmund
Burke se opunha às concepções elaboradas pela Revolução Francesa, que propunha
que os "homens eram iguais e sobretudo passíveis de aperfeiçoamento. Tal
aprimoramento podia ser desenvolvido pelo refinamento da razão humana e pela
reforma das instituições sociais e políticas". De certa forma, a Revolução
Francesa através de seu discurso modernizante fez com que os homens
acreditassem no auto-interesse racional e que este constituía a base suficiente
para a vida social, o seu bem-estar e sobretudo a felicidade. Nesse sentido,
tanto o pensamento como a ação de característica individual precisava se
libertar das questões tradicionais.
Por
conseguinte, o pensamento de Burke se apresenta com um posicionamento contrário
aos ideais revolucionários. Segundo Burke, os poderes racionais de todos os
indivíduos são limitados. A sociedade está interligada não pelas questões
racionais, mas pelas questões morais e pela força das tradições. O progresso da
civilização depende da manutenção da ordem social.
A
ideologia conservadora se caracterizou durante todo o século XIX pela defesa de
políticas com sentido negativo, entre elas cita-se a dificuldade de se adaptar
ao crescimento da democracia, a relutância em proporcionar sentido à soberania
popular ao imanente sufrágio masculino. Uma das características do
conservadorismo naquele contexto era apresentar distinções entre ricos e pobres.
Aqueles que não obtinham posse automaticamente ficavam excluídos do processo
político. A estabilidade e o interesse no bem comum estavam atrelados à
propriedade.
A
visão de conservadorismo que apresentou aspectos relevantes e se colocou no
contexto mundial como precursora do desenvolvimento tanto político quanto
econômico está atrelada ao pensamento inglês. Nos Estados Unidos vários
conservadores de renome defenderam a proposta do liberalismo clássico.
De
acordo com Vincent, o pensamento conservador pode ser classificado de cinco
formas distintas: conservadores, tradicionalistas, românticos, paternalistas,
liberais e da Nova Direita. A proposta que apresenta aspectos de hegemonia está
concentrada sobre o conservadorismo liberal. De acordo com essa visão, a
economia precede sobre todos os aspectos às questões políticas, a obrigação
precede o direito. "O conservadorismo liberal tende a aceitar a maior
parte dos dogmas formais do liberalismo clássico: ênfase no individualismo,
direitos pessoais e legislação mínima do Estado".
De
acordo com Hayek existem duas filosofias políticas que proporcionam suporte ao
liberalismo: a que se "baseia em uma interpretação evolucionária de todos
os fenômenos da cultura e da mente e numa visão introspectiva dos limites dos
poderes do raciocínio humano. E a que se baseia no "racionalismo
"construtivista", uma concepção que leva ao tratamento de todos
fenômenos culturais como produto de desígnio deliberado".
No
primeiro momento, o conservadorismo liberal se opôs às políticas liberais
apresentando teorias que não convergiam com as propostas liberais. O
conservadorismo se opunha sobretudo contra os aspectos históricos, tradicionais
e morais que regiam a sociedade.
De
acordo com Giddens, os principais conceitos do conservadorismo são: a
autoridade que está relacionada com os contratos, a lealdade que se relaciona
com a subserviência e submissão às questões da autoridade e a tradição, que se
refere aos costumes e cerimoniais. O ponto de divergência cabal entre o
conservadorismo e o liberalismo situa-se sobre as questões que se referem à
racionalidade. A dicotomia entre a teoria e a prática.
O
conservadorismo não está concatenado com a questões racionais, com o domínio
cognitivo da natureza e sim sedimentado sobre as questões práticas e
sentimentais do cotidiano. O processo de racionalização do mundo ocidental
parte portanto, "da necessidade das religiões mundiais de subsistir a
magia pelo domínio cognitivo da natureza e por uma explicação ética capaz de
ser justificada".
Se
para Oakeshott, o conservadorismo se apresenta como algo avesso às mudanças,
para o conservadorismo moderno a mudança é de vital importância para sua
sobrevivência. Sem o processo de alterações constantes da sociedade, sem a
apresentação do novo, o conservadorismo moderno está fadado ao fracasso.
De
acordo com Giddens, o velho conservadorismo "defendia a hierarquia, a
aristocracia, a primazia da coletividade, ou do Estado, sobre o indivíduo, e a
importância proeminente do sagrado". Por conseguinte, um questionamento se
faz necessário nesse momento. Até que ponto existem convergências entre o
conservadorismo e a nova direita?. Um ponto de convergência crucial que os
tornam praticamente inseparáveis está relacionado com a questão libertadora do
empreendimento mercadológico. A posse da propriedade enfocado pela nova direita
reforça a tese conservadora e promove sobretudo o bem-estar familiar. O novo
mercado pregado pela nova direita não se compatibiliza com a intervenção do
Estado. A intervenção do Estado só é cabível para a manutenção da ordem e da
lei que se relaciona com os princípios hierárquicos conservadores. Tendo em
vista o declínio da família, instituição a qual é defendida ferozmente pelos
conservadores a nova direita atribui a culpa aos intelectuais e ao
permissivismo da esquerda. Segundo Giddens, "as mudanças estruturais que
afetam a família, e outras áreas da vida social fora da esfera do trabalho
assalariado, são estimuladas pelas próprias influências promovidas pela Nova
Direita e o seu disfarce neoliberal.
Nesse
sentido, as alterações e mudanças sociais provocadas pela nova direita choca-se
com a visão mais arcaica do conservadorismo, ou seja, aquela ligada com as
questões referentes à tradição. Internacionalização do capital, comunicação
eletrônica, mercado financeiro, são atuações marcantes do discurso hegemônico
liberal. No entanto, proporcionam o que Giddens denomina de destradicionalização
para quem significa uma "aceleração da reflexividade social
intensificada". Tal visão se contrasta com a proposta de Oakeshott para
quem o conservadorismo "prefere o conhecido ao desconhecido, o que foi
experimentado ao que não o foi, o fato ao mistério, o real ao possível, o
limitado ao ilimitado, o próximo ao distante, o suficiente ao superabundante, o
conveniente ao perfeito, o riso de hoje à felicidade utópica".
A
nova direita se relaciona com a supremacia econômica devido ao seu caráter
prático, imediatista, de tempo real. Nesse sentido, se opõem às questões
longínquas da política. A política para a nova direita se relaciona com os
aspectos teóricos das questões da vida e se identifica com o processo da razão
abstrata, tão refutada pela ideologia conservadora.
Uma
das características do antigo conservadorismo concentra-se sobre a busca
constante pelo equilíbrio da identidade. O novo conservadorismo se fortalece
com a quebra, com a ruptura das identidades. A identidade para o novo conservadorismo
é sempre transitória, fugaz, uma vez que a busca incessante pelo inexplorado
apresenta-se de forma latente na sociedade.
A
homogeneização dos discursos é um dos trunfos da nova direita. A supressão das
culturas e o desprezo pelas questões locais são características marcantes do
neoliberalismo vigente. Tal característica diverge da proposição política dos
conservadores que a veêm somente com características artísticas e de
conversação.
O
ponto de convergência central entre a democracia e o conservadorismo se
estabelece na esfera da individualidade. O termo democracia não se relaciona
com a democracia dos antigos propostas por Bobbio, aquela cuja centralidade
está no indivíduo, mas sim aquela que se denomina como democracia
representativa.
Nesse
sentido, o elo entre o conservadorismo e o sistema democrático está em que
ambos enxergam o indivíduo dotado de aspectos morais e permeado pelas questões
do direito que lhe é inerente por natureza.
Na
democracia moderna como expõe Bobbio " o soberano não é o povo, mas são
todos os cidadãos". Nessa mesma linha de raciocínio Bobbio continua
"a democracia moderna repousa em uma concepção individualista da
sociedade"
O
Estado para o velho conservadorismo era centralizador e autoritário,
apresentando uma idéia de república unitária, sendo o Estado o regulador da
própria sociedade.
Nesse
sentido, o velho conservadorismo apropria-se do discurso de Hobbes, assumindo
um Estado absolutista, não só impedindo a "guerra de todos contra
todos", mas principalmente para a manutenção do "status quo" da
elite dominante.
O
novo conservadorismo apresenta aspectos que de certa forma "rompem"
com os discursos do velho conservadorismo. O novo não se apropria do Estado,
mas utiliza-o para os seus próprios interesses. O novo conservadorismo não
busca na religião os seus anseios. A racionalidade proporciona sentido à vida.
A técnica se sobrepõe ao nepotismo.
O
novo conservadorismo ao contrário do velho, "incorpora" as massas nas
decisões políticas. Cabe ressaltar que essa incorporação está restrita somente
às questões de representação e não sobre a perspectiva de efetividade.
Por
conseguinte, a sociedade contemporânea passa por momentos de transformações. De
acordo com Giddens "as transformações institucionais, particularmente as
que sugerem que estamos nos deslocando de um sistema baseado na manufatura de
bens materiais para outro relacionado mais centralmente com informação."
As transformações institucionais
ocasionadas pelo mundo pragmático da informação, transformou também as relações
políticas. A vivência do mundo em tempo real, a relação espaço-tempo marcou um
processo revolucionário, não no sentido marxista de ruptura, mas sim um
processo de transformação extrema sobre as verdades políticas, antes expressas
tanto por membros da direita, quanto por membros da esquerda.
Se o
velho conservadorismo apoderava-se do Estado e impunha uma visão nacionalista,
o novo conservadorismo apóia-se sobre o Estado dando-lhe um viés
internacionalista. Uma relação de subserviência para com as políticas ditadas
pelo exterior.
As
transformações ocorridas na sociedade através do que podemos denominar de
modernidade, serviram para estabelecer conexões sociais com conotação
internacional.