Saturday, 5 October 2024

O box 19



No box 19 tem vida, lá, tem máquinas também. Máquinas de todos os tipos e gostos a fim de salvar vidas e deixar outras aflitas, mas enfim, esse é o box 19. Lá tem esperança, tem Deus de todas as religiões, tem orações e preces, tem fé e divindade.

No box 19 tem sorrisos também, pode parecer uma contradição, mas o sorriso faz a vida e desperta a esperança, muitas vezes é onde se pode ver a presença divina, mas tem lágrimas também, onde se expressa a dor, o vazio da ausência e a incerteza do futuro. A vida e a morte estão lado a lado e são concorrentes.

O sangue corre para todos os lados no box 19, sai do humano e vai para a máquina, mas também faz o caminho inverso. O sangue esquenta e esfria de acordo com a necessidade, o frio e o quente que se sente, filtrá-lo é essencial para a continuidade da vida, creio que pode ser chamada de máquina da vida para aqueles cujo sangue se torna um problema devido às impurezas que carrega - bendita seja a máquina.

O suporte suporta as necessidades: aminoácidos, antibióticos, soros, enfim, medicamentos de todos os tipos e leva consigo leveza às dores do mundo. Os medicamentos correm por uma serpentina e entram pela via sanguínea, o seu fluxo é direto e certeiro - eles se misturam ao sangue, corrigindo percursos e aliviando aflições.

Não existe silêncio no box 19, todas as máquinas se manifestam, cada uma em seu tempo e razão, cada uma carrega em si, números importantes. Descobri depois de longa data que os números refletem a saúde que temos - posso dizer que ter saúde é uma questão numérica, e os números traduzem os nossos hábitos, costumes e jeito de ser.

As noites no box 19 são longas, um entre e sai de gente o tempo todo. Coloca medicamento, tira medicamento. A cadeira para dormir não é tão ruim quanto se pensa, ela tem suas limitações, mas o que irrita mesmo é a luz acesa do corredor, ela é capaz de causar um transtorno mental, tal a sua luminosidade intensa e  impertinência – eu olho para ela, ela olha para mim e parece que me solta um sorriso sarcástico e filho da mãe, dizendo:

_ Vou te ferrar essa noite!! Kkkkkk.

E como dizia minha tia:

_ Eu xingo! Mas nada posso fazer, a não ser trocar o lado de dormir e ter a paciência para que o sono chegue depressa. O ar-condicionado costuma ficar sem controle. O frio toma conta do quarto. O cobertor ralo e de tom amarelo do Hospital não dá conta, outros são necessários, além de ter que dormir de calça, camiseta e meias nos pés, um desconforto geral. O “sono” termina quando o Doutor entra para dar notícias que nem sempre são boas, mas são esperadas como nunca e assim, o dia se faz presente.