Novembro
de 1996. O dia amanheceu frio na Cidade do México e ele acordou animado. Mesmo
com o nariz sangrando por causa da altitude, não deu importância, era dia de
jogo de Eliminatórias da Copa do Mundo de Futebol de 1998. México e Honduras se
enfrentariam naquele final de tarde no Estádio Azteca - estádio onde o Brasil
se sagrou tricampeão de futebol. Ele estava emocionado e eufórico.
Um de
seus maiores sonhos na vida era assistir um jogo entre seleções num estádio,
não importava nem qual e nem aonde. No Brasil isso era quase impossível, ingressos caros, lugares longínquos e a dificuldade de locomoção eram os
impeditivos centrais.
Ele
reclamou durante o café da manhã no Hotel Plaza Madrid com o garçom sobre a
dificuldade de conseguir ingresso para o jogo. Os cambistas mexicanos são
piores que os brasileiros, descobriu isso in loco e chegou à conclusão
que isso deveria ocorrer no mundo todo. Não era um problema peculiar do
comportamento nefasto do brasileiro, mesmo assim, acabou comprando a entrada
por um preço para lá de bom, tendo em vista o valor da moeda local.
Não
poderia perder a chance, tinha que aproveitar a oportunidade, havia viajado
para o México para um Congresso de Linguística, fruto de um trabalho científico
na universidade, ficaria uns dez dias na cidade, tinha tempo o suficiente para
o turismo nas pirâmides de Teotiuacan.
Passou o
dia ouvindo os Mariachis com a camisa do Puma num bar em frente ao Hotel,
regado a cerveja Corona, pisco e taco. Falando de futebol com os mexicanos,
descobriu que Pelé realmente foi o maior de todos e a reverência ao futebol
brasileiro não tem limites.
Chamou o
táxi perto das quatro da tarde e percebeu que todo fusca verde sem o banco da
frente era um carro em potencial para levá-lo ao Azteca. Aquilo o assustou, mas
não deu outra, um desses parou, ele entrou ressabiado e praticamente atravessou
a Cidade do México para chegar ao Estádio, aproximadamente uma hora e meia
dentro do carro, uma verdadeira epopeia, tendo em vista o trânsito caótico, a velocidade
sem limites e a segurança quase zerada.
Quando
desceu, percebeu que os mexicanos quando vão ao estádio levam cornetas nas
cores verde, vermelha e branca e tocam sem parar, um barulho ensurdecedor,
difícil era encontrar alguém sem a camisa do México, o fanatismo pela seleção
estava estampado em cada rosto na fila quilométrica para entrar.
Andou
quase um quilômetro para chegar ao seu lugar no Estádio e quando avistou Jorge
Campos, o goleiro mexicano baixinho e folclórico com roupas de fazer inveja a
vagalume, ficou perplexo e feliz, lembrou de suas defesas na Copa do Mundo de
1994, alguém que tantas vezes tinha visto pela televisão em jogos memoráveis e
defesas incríveis mesmo com a sua baixa estatura, um verdadeiro mito do futebol
mexicano.
O jogo
mal havia começado e Hermosilla, o camisa oito da seleção mexicana, fez um a
zero. A explosão da torcida ficou em sua memória, os alambrados balançavam sem
parar, as cornetas soavam no estádio todo e um medo coletivo se apropriou em
sua mente, nunca havia visto nada igual no futebol brasileiro, uma verdadeira “loucurada”
feliz tomou conta do ambiente, inacreditável, ficou parado, olhando as
bandeiras mexicanas tremulando e a torcida gritando. Estava eminentemente feliz
e temeroso ao mesmo tempo.
O jogo
acabou em 3 x 1 para a seleção mexicana. Zaguinho, o brasileiro naturalizado
mexicano, fez o gol final. Os mexicanos estavam radiantes pelo placar da
partida, a qualidade do jogo poderia ser discutível, tendo em vista a
fragilidade da seleção hondurenha, mesmo assim a alegria da torcida era
contagiante. A preocupação depois era voltar para o Plaza Madrid, mas nada como
uma Corona com limão bem gelada para ajudar na missão, afinal, andar de táxi na
Cidade do México não é para os fracos.