O ano ele não se recorda de maneira exata, mas tem a certeza de que aquela partida de futebol entre a Ferroviária de Araraquara e Palmeiras foi disputada as onze horas da manhã de um domingo.
Naquele
domingo, acordou bem cedo, como de costume, foi até à padaria do Santana que
fica na esquina da Cristovão Colombo com o antigo ginásio Narciso da Silva
Cesar, comprou alguns pães, um litro de leite tipo C e algumas gramas de
mortadela. O café já estava pronto, a mãe havia providenciado ainda as seis da
manhã.
Estava
ansioso para assistir ao jogo na Fonte Luminosa, por isso, resolveu fazer tudo
às pressas, pois o Estádio ficava distante e como tinha que ir a pé, era
prudente sair umas duas horas antes da partida começar para não atrasar. Como
todo menino ansioso, saiu logo as oito e meia da manhã e foi em direção ao
Parque Infantil, onde havia marcado com alguns colegas de se encontrarem.
O calor
era escaldante, atravessaram a rua três e foram em direção a rua dois para
depois pegarem a Bento de Abreu em direção à Fonte Luminosa, no caminho, resolveram
fazer um pit stop na sorveteria do Kawakami, na esquina da rua três com
a Borges Correia, cada um pegou um picolé e foram falando dos astros que estariam
em campo, pelo lado da Ferroviária, Douglas Onça e sua turma, de outro,
Jorginho Putinatti, Eneas, jogadores de seleção brasileira.
As peripécias
de menino não podiam faltar, para chegarem mais rápido, iam apertando a campainha
das casas e depois saiam correndo para não serem pegos em flagrante e ouvirem
palavrões mais pesados, alguns, levavam bodoques e sacos de mamonas para derrubar
as frutas das árvores alheias, pelo caminho, a molecada ia aprontando e deixando
marcas por onde passava.
Quando
chegaram ao estádio, a fila para comprar ingresso era longa, a movimentação era
intensa. Os camelôs vendendo as camisas falsificadas e relativamente baratas,
as bandeiras do Palmeiras estendidas pelo caminho, algumas nos varais improvisados,
outras nas costas dos torcedores mais fanáticos.
Como já
estavam acostumados com os torcedores da Ferroviária e a turma da Boca do Lixo,
resolveram ir ao portão de entrada da torcida visitante, lá, encontraram alguns
ônibus, lotados de torcedores vestindo verde e branco da cabeça aos pés. Conheceram
um jovem japonês que usava uma camiseta da torcida TUP – Torcida Uniformizada
do Palmeiras, que levava consigo um bumbo gigante e percebeu que havia uma
verdadeira bateria de escola de samba para entrar no estádio. A polícia fazia a
ronda do local e dava “geral” na galera, afinal, a torcida do Palmeiras não possuía
fama se ser muito boazinha e para evitar briga, a escolta era pesada.
A molecada
assistiu o jogo do alambrado, alguns mais exaltados se penduravam e o balançavam
de forma violenta, tinha a impressão de que aquilo fatalmente viria ao chão, o
cachorro da PM estava sempre com a boca aberta esperando algum espertalhão
invadir o campo de jogo, alguns torcedores ofendiam o bandeirinha intensamente,
outros, tentavam acertar o assistente com laranja, rádio, chinelo e outros
pertences. Aquilo tudo parecia ser muito engraçado e pareceu ser lugar comum do
futebol brasileiro. O futebol brasileiro realmente se parecia com um circo, teve
essa impressão.
Como o
jogo acabou com a vitória do Palmeiras por três a dois e ainda com gol no
final, saíram do estádio sem entender nada, eles esperavam o empate, mas tudo
aquilo deu muita fome e já era quase uma hora da tarde. Na volta para casa, pararam
no bar próximo ao Batalhão da Polícia na Vila Ferroviária.
- Seu
Geraldo, pode descer uns cinco pães com mortadela e umas duas tubaínas. Esse jogo
da Ferrinha deu uma fome danada! Disse um dos moleques, morto de fome e sede,
louco para chegar em casa.