Sunday 5 November 2023

Tota: o mago dos campinhos de Araraquara

 

Ele sempre chegava em sua magrela azul e com sua pastinha preta embaixo do braço. A molecada jogando bola – ele estacionava e ficava olhando, não sabia ao certo quem era o alvo, mas uma coisa tinha certeza, sempre queria um novo talento para o futebol, assim era o Tota.

Andava de campinho em campinho, geralmente de terra, os gols feitos de bambu ou com sobras de madeira, o terreno de forma costumeira era penso para um dos lados, sem contar a erosão que existia no meio do campo e formava os buracos, a bola quicava muito e mesmo assim, a persistência era maior que a teimosia e Tota nunca desistia.

Após o término das peladas, Tota sempre chamava os talentos para uma conversa ou para assinar uma ficha e assim, assumir um compromisso com a sua equipe – seria uma espécie de contrato a ser assinado, a garantia de que aquele talento vestiria a camisa de sua equipe – a concorrência entre os treinadores da época era intensa e não podia dar bobeira, garantir os melhores era fundamental para o sucesso.

Para Tota, todos os meninos eram iguais, só os distinguia pelo talento aplicado no campinho, se tivesse talento, jogava em seu time, se não tivesse, podia até ir treinar, mas dificilmente seria escalado, já que sua personalidade exigente e vencedora não permitia.

Em campo, se transformava no banco de reservas, dava de dedo na molecada, chamava a atenção e cobrava, o jogador de seu time nunca podia chegar atrasado, já era chamado de lado e muitas vezes nem vestia a camisa do time, podia ser o craque que for, não interessava, tinha que cumprir o compromisso com a equipe.

Tota fazia o esforço, levava em um saco o uniforme do time amarrado na garupa da bicicleta mesmo sob o sol escaldante da Morada, as meias amarradas umas às outras para não se perderem, as camisas geralmente amarrotadas e os calções de vários tamanhos misturados, para pegar o de tamanho certo, a sorte precisava acompanhar, mas estava tudo bem, quem estava no vestiário, estava feliz, pois estar escalado para participar do jogo já era uma vitória, se iria entrar em campo ou não, era outra história, mas uma coisa o menino tinha certeza, estava entre os melhores.

Tota era muito parceiro de Jair Bala, os dois viviam no buteco que havia ao lado do extinto Cine Plaza, no alto da rua dois, geralmente tomando uma cervejinha para refrescar a cuca – santista de coração, fazia questão de exaltar os títulos conquistados e as proezas de Pelé e sua turma.

Tota era incansável na busca por talentos, muitos que passaram por suas mãos chegaram ao profissional, outros tantos, não, mas sempre levaram consigo os ensinamentos do mestre: a busca pela disciplina, a perfeição nas ações e a formação do caráter.

E como diz a poesia de Bertold Brecht:

“Há homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis!”

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