SANTOS JUNIOR, Orlando Alves dos; RIBEIRO, Luiz Cesar de
Queiroz; AZEVEDO, Sergio de (orgs). Governança democrática e poder
local: a experiência dos conselhos municipais no Brasil. Rio de
Janeiro: Revan, Fase, 2004.
Resenha
A experiência dos Conselhos Municipais no Brasil coincide com o limiar
da crise que aflige o sistema democrático em todo o mundo.
Mesclar
a democracia representativa com a democracia direta foi a alternativa
encontrada para diminuir os impactos causados pela inoperância do
atual sistema. Se for levada em consideração a premissa levantada por Bobbio
(1) de que a democracia não cumpriu as suas promessas e por isso necessita ser
reinventada, os autores do presente livro apontam justamente para o ponto
nevrálgico do sistema – os Conselhos Municipais. Surgem como um ponto de apoio
para a democracia representativa, uma vez que se trata de um mecanismo de
democracia direta inserido no contexto político brasileiro.
A
experiência dos Conselhos Municipais no Brasil, assim como os estudos que
permeiam a referente obra levantam duas questões que trabalham no sentido de
contribuir para a não operacionalização das atividades propostas pelos
Conselhos, mas que convivem conjuntamente para proporcionar a fase inicial de
um processo de transformação política – de um lado, encontra-se o sistema
educacional brasileiro que não apresenta uma formação adequada aos cidadãos, o
que dificulta a inserção dos mesmos nos canais de participação e efetivação do
processo democrático, por outro lado, tem-se a formação do Estado brasileiro
que possui em seu histórico tomadas de decisões com características verticais
sem consulta às bases, fruto de mecanismos políticos autoritários.
Isso
significa que a obra denuncia a gestação de uma transformação do processo
político brasileiro calcada no exercício da cidadania política, mesmo possuindo
pontos de adversidades para o sucesso da empreitada – trabalhando sob a
anuência da Constituição Federal que proporciona respaldo e subsídio através do
macro sistema político, os autores contemplam de forma significativa ascriações políticas
dos governos municipais e da sociedade civil das principais capitais
brasileiras, uma vez que as mesmas fomentam o exercício da cidadania política,
abrindo espaço para a criação de uma sociedade poliárquica (2) no
sentido dahlsiniano.
Ora,
isso não significa que o Brasil se transformará em uma ágora gigante,
nem marca um regresso à democracia dos antigos, como expõe Bobbio, apenas
trata-se de um processo de aperfeiçoamento da democracia – democracia marcada
pela acelerada urbanização e pelo superpovoamento. A obra aponta caminhos para
que a democracia torne a trilogia input, output e feedbackfenômenos
repetitivos e constantes no cenário contemporâneo.
Pretendendo
estabelecer diretrizes para a inserção dos Conselhos Municipais no cotidiano
político brasileiro, os autores trabalharam com muita perspicácia o
conceito de governançademocrática – “padrões de interação entre as
instituições governamentais, agentes do mercado e atores sociais que realizam a
coordenação e, simultaneamente promovam ações de inclusão social e assegurem e
ampliem a mais ampla participação social nos processos decisórios em matéria de
políticas públicas”.
Através do
conceito exposto, percebe-se que os autores contrapõem o Estado, o mercado e a
sociedade civil como atores principais do sistema democrático em voga, mas,
será que os governos municipais são capazes de concatenar e aglutinar os
interesses do poder público, do mercado e da sociedade civil em seu interior?
De acordo com
os estudos referidos na presente obra 62% dos conselheiros possuem alto nível
de escolaridade, desse total, 81% são conselheiros do setor governamental,
representando assim o fenômeno da tutela e da elitização dos mecanismos
democráticos, fomentadores da participação cidadã proposta por Gohn. Muito
embora o quadro apresentado pelos Conselhos Municipais das principais capitais
brasileiras demonstre a forte influência do governo local em suas composições é
justo afirmar que os mesmos também são palcos da luta entre os movimentos
sociais organizados e os grupos políticos locais que lutam de forma constante
para a manutenção ou a ampliação dos seus poderes.
A
obra apresentada por Santos Junior, Ribeiro e Azevedo merece ser vista
como instigante e inovadora, uma vez que apresenta subsídios importantes para
uma sociedade mais democrática e participativa além de nos convidar ao trabalho
do pensamento para a construção de um novo modelo político.
Notas:
1. Na obra “O futuro da democracia”, Norberto Bobbio faz menção de que a
democracia não cumpriu as suas promessas e por isso faz-se necessário
reinventá-la.
2. O conceito de poliarquia é proposto por Robert Dahl na
obra denominada “Poliarquia”, segundo o autor, “poliarquia são regimes que
foram substancialmente popularizados e liberalizados, isto é, fortemente
inclusivos e amplamente abertos à contestação pública” .
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