Friday 5 April 2013

O Estado em Nicolau Maquiavel


Nicolau Maquiavel (1469 – 1527)


“O que é certo é que a não ser que haja uma mão firme no leme, a nave do Estado naufraga. A sociedade humana entrará em colapso, terminando em caos e imundície, a não ser que um especialista competente a dirija. E embora Machiavel, pessoalmente, ofereça razões para preferir a liberdade e um governo republicano, há situações nas quais um príncipe forte será preferível a uma república fraca” (BERLIN, 2001, p. 25)

A política encontra-se diretamente relacionada com as questões ligadas ao Estado. Como se trata de um curso de políticas públicas, entender os conceitos e a evolução do conceito de Estado é ponto crucial para o desenvolvimento das atividades.

Para iniciar as discussões, vamos ver o conceito de Estado para os principais autores da ciência política:

Maquiavel não escreveu apenas um conceito de Estado. Para entendê-lo em seu contexto mais amplo, precisamos nos reportar à sociedade da época e suas relações políticas, porque de uma forma geral, ele trabalha com precisão cirúrgica as relações éticas e morais envolvidas na política. Questões como o comportamento dos governantes, levando em consideração a moral cristã que permeava a sociedade florentina é fundamental para entendermos o seu pensamento.

Para contextualizar as idéias de Maquiavel, esboçaremos em linhas gerais o quadro político da sociedade vivida pelo autor:

• Maquiavel e a Sociedade

1. As relações de poder existentes entre a Igreja e o Estado.O poder divino dominava o pensamento político central, onde Deus ainda era o Centro do Universo.

2. O capitalismo mercantilista e a ascensão das relações econômicas;

3. A ascensão da Monarquia, o desenvolvimento dos Estados Nacionais e a criação das Instituições Políticas (Poder Judiciário, Exércitos, Burocracia e as cortes)

4. A ascensão da Monarquia desencadeou o nascimento do Estado absoluto, onde ocorreu a preservação da ordem e os privilégios da classe aristocrática e o controle das classes menos favorecidas – o proletariado.

5. Países como a Inglaterra e a França se consolidaramm em território europeu e se destacaram como poder central.

6. Não existia ainda a Itália como Estado. O que existia era um conjunto de pequenas cidades-estado e que eram rivais entre si e ao mesmo tempo essas cidades-estado eram disputadas pelos rivais: O Papa, a França e a Espanha lutavam constantemente para conseguir dominá-las.

Vimos até o momento o quadro das relações políticas em um contexto mais amplo, agora, vamos entender como Maquiavel olhava o homem e o seu interior. Essa visão será capaz de desmistificar o seu pensamento que ficou marcado de forma negativa através dos tempos. Maquiavel foi muito mal interpretado o que lhe garantiu a fama de mau, mas isso é porque de uma forma geral, não compreendemos a sua visão de homem.

• Maquiavel e a visão de homem

1. O cerne do pensamento de Maquiavel sobre o homem está centralizado na palavra racionalidade, ou seja, uma ruptura com o pensamento da Idade Média, onde Deus era o centro do Universo. Quando o autor mencionou a palavra racionalidade ele foi na contramão dos princípios cristãos vigentes até então. A partir desse momento, o centro do universo passou a ser o próprio homem;

2. A análise de custo/benefício em Maquiavel precisa ser interpretada do ponto de vista da obra – O Príncipe. No contexto da obra, Maquiavel utiliza duas expressões fundamentais: virtú (não vamos interpretá-la como virtude, pois isso nos remeteria a um conceito cristão e poderia nos deslocar para uma visão de virtude moral) e a expressão fortuna. A Fortuna se trata da ordem das coisas em todas as dimensões da realidade e que influenciam o sistema político. Para interpretarmos a obra de Maquiavel é necessário aliarmos o conceito de virtu com o conceito de fortuna. Onde virtú seria a capacidade do Príncipe de controlar as ocasiões e os acontecimentos e a fortuna seria a sorte em ter êxito em suas ações. A fronteira entre a virtú e a fortuna celebrou a entrada de Maquiavel para a história como “vilão” uma vez que o Príncipe para atingir os seus objetivos não abria mão dos meios mais cruéis, ou seja, que para atingir os fins não importava os meios empregados para conquistá-los.


3. Maquiavel estuda o comportamento humano através da perspectiva da antiguidade clássica, onde o homem possui traços humanos imutáveis: ingratos, covardes, simuladores e volúveis. Esses traços podem levar a conflitos constantes e dentro de um reinado levá-lo a anarquia. É em cima desses traços que os Príncipes deveriam tomar as suas atitudes tendo em vista a preservação do reinado.

A visão de homem fica explicita em Berlin (2001, p.48), onde expõe que em Maquiavel a visão é social e política. Donde o conceito tradicional dele como um simples especialista em como se levar a melhor sobre os outros – um cínico vulgar que afirma que os preceitos da escola dominical são muito bons em si, mas em um mundo cheio de homens maus você também precisa mentir, matar e assim por diante, para poder chegar a algum lugar – ser incorreto.

• A noção de história e de política em Maquiavel

O conceito de história em Maquiavel está centralizado sobre a sua idéia de homem. Maquiavel enxerga o homem através de uma lente pessimista, mesmo ciente de que os valores cristãos: a bondade, a caridade, a complacência são virtudes, mas em sua visão o homem é mal por natureza, por isso, esse pessimismo e esse negativismo na história.

Nesse contexto, a visão de política exposta por Maquiavel é dependente desta posição pessimista e negativa, uma vez que o mesmo passa a ver a política de forma independente da Igreja e como sendo produto do próprio homem. Maquiavel rompe com a visão de política estipulada pela Igreja e causa impacto no mundo cristão, é nesse contexto que se desenvolve a expressão “maquiavélico” que foi disseminada aos quatro cantos do mundo.

Como sendo produto do próprio homem, a política tem a capacidade de ter vida própria, as suas leis, as suas regras que não estão escritas em nenhum manual cristão – a política possui as suas regras particulares e se caracteriza como ponto fulcral de luta pelo poder.

Maquiavel acredita que todo princípio pode ser corrompido, mas que pode ser atenuado ou agravado dependendo da (fortuna ou da virtú).

• O Estado em Maquiavel

Maquiavel não trabalha com a definição explicita de Estado – ele expõe que o Estado em linhas gerais está presente em todos os setores da vida humana. O Estado para Maquiavel é onipresente, exerce uma força superior ao mundo dos homens e tem que ter a capacidade de exercer a sua plenitude.

Em linhas gerais, o Estado está acima do bem e do mal, regulamenta a vida entre os humanos, organiza as leis, rege-as e cumpre-as, por isso é absolutamente normal que o Estado seja o fim de tudo e por isso se justifica qualquer meio empregado.


Referência


BERLIN, I. A originalidade de Machiavelli. IN: O Príncipe. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001.



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